terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Os minutos atrás de mim

Final de ano, correria, falta de tempo e aquela angústia chamada "não-vai-dar-tempo" pega a todos.
Olho para trás e sempre dou de cara com eles: os minutos atrás de mim. Eles passaram, oras.
O dia 31 de dezembro aproxima cheio de promessas. Primeiro, um dia de expectativas, mas sem tanta correria com uma véspera de Natal. Não há os presentes. Depois, a véspera para o ano-novo (nunca sem se com ou sem hífen...) sugere algo leve, festivo, liberto. Entristeci-me ontem, com uma reportagem no caderno para adolescentes da Folha de S.Paulo. Era um grupo de meninos e meninas que odiavam as festas da passagem do ano, a maioria atribuindo a noite a uma série de encontros sem sentido e sentimentos de falsidade. Triste pelos sentimentos. E triste porque pensei: "nossa, se são tão amargos assim, como não notam que estas situações podemos ter todos os dias??"
Ainda não é véspera, mas eu já acalmo meu coração. Rumo a um 2009 verdadeiro. Seja nos sorrisos ou nas lágrimas motivadas pela prosa ou pela poesia.
Não importa. Quero é viver.

domingo, 7 de dezembro de 2008

Pela janela de trás

Quando eu era criança, era proibido abrir a janela de trás dos poucos carros quatro portas que em que eu circulava. Era perigoso. Mas era uma chance deliciosa e então eu apenas sonhava com ela.
Adoro janela. Ver as pessoas nas ruas, imaginar seus destinos, suas histórias. Por isso sempre preferi ônibus a metrô. O metrô não me deixa ver histórias.
Agora existe um recurso. Os vidros de trás dos quatro portas abrem somente até uma determinada altura. É proibida a olhada de uma criança mais do que aquilo.
Mas esta semana vi uma resistente.
Ela tinha uns quatro anos e estava lá, diante de sua limitação de janela.
Mesmo à noite, mesmo perigoso, mesmo com a violência, mesmo com aquele vento gelado, ela estava lá, de ponta de nariz na janela.
O vento vinha forte, ela fechava os olhos. Mas só por milésimos de segundos. Suas piscadelas não podiam impedi-la de ver as histórias.
Os pais, nos bancos da frente, também tinha suas janelas abertas. Mas estavam mais envolvidos com suas próprias histórias.
A menina queria mais. E viu.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Olha o troco!

Ele estava ali, andando na mesma calçada, puxando as prateleira em frangalhos, exalando mau humor. Vi e era inacreditável. Uma viagem ao passado e uma comum mas sempre incrível constatação: há certas coisas que nunca mudam.
Todo começo de ano, a mesma coisa. Chegava o momento de ir ao bazar daquele grosseiro senhor de óculos de armação grossa, semblante de sofrimento, roupa antiga. Minha mãe só queria ir à livraria dele, que tinha pretensão de bazar.
- É mais barato, Cris. Além disso, sempre encontramos todos os livros lá.
E ela tinha toda a razão. Suportávamos aquele mal-humorado vendedor pelas vantagens. Mas nem por isso, relutava sempre à minha visita anual.
- Será que não posso ficar em casa desta vez?
Nunca podia. Parecia ensinamento. Deveria ser mesmo, um teste de resistência, controle. Quantas vezes na vida não temos que encarar o que não queremos?
Eu sempre ia.
E era a mesma coisa. Entrava naquele caos de infindáveis pilhas de livros. Eu sempre achava que ele não iria encontrar. E ele sempre encontrava o pedido. Existia uma ordem nele naquele caos. Impossível perceber como.
Após horas de busca, as inúteis tentativas dos clientes na ajuda e os berros constantes que ele remetia à filha, os livros estavam ali, todos na nova pilha, a pilha de livros da Cris.
Era o fim da tortura. Que sempre terminava com uma grosseria final. Não sei por que, eu e minha mãe nos perdíamos entre as publicações enquanto ele contabilizava nosso dinheiro.
Nós, à beira da saída daquele empoeirado local, a minutos de nos livrarmos da bagunça em forma de livros, ele gritava do caixa:
- Ei, olha o trooooco!
E não é que ele ainda está lá?