domingo, 29 de julho de 2007

Fotografei com o coração

Imagine seu aniversário. Agora olhe para a mesa. Estão lá seus irmãos, seus sobrinhos, os agregados que você já ama também e seus amigos. Varie no zoom. Estão todos lá, contando sua história. Um a um. Neste ano, há também três novos personagens. Com os antigos, eles contam mais uma parte da sua vida. E ali você consegue ver a sua trajetória. Seu antes. Pensar como é que chegou ali. Olhar pelo retrovisor, como ouvi certa vez. Os três novos são o “ali”. E olhe de novo. Eles estão rindo. Faz frio. Mas não é problema. O que importa é contar a história com você. É permitir as coincidências. Ver as linhas incidindo. No meio, poesia. “Pelos meus textos sou mudado mais do que pelo meu existir.” É o pantaneiro poeta Manoel de Barros dando sua graça. Ah, tem perfume também. Muito. Tudo cheira bem porque o motivo ali é amizade. E, por mais que eu reclame da vida, ela ainda me dá presentes como estes. Pessoas maravilhosas que me cercam e que deixam que seus sorrisos, abraços, suspiros, emoções e memórias se unam às minhas. E assim sou eu. Sempre.

Foi nas músicas da vida

Há alguns dias fiz aniversário. Mais do que em final de ano, aniversário para mim é momento de repensar a vida. Mas nada forçado. Acontece. É aquela coisa do ciclo, do rever. Perto da data, assisti a um show do Zé Renato, um cantor que adoro há muitos anos. Muitos mesmo como pude confirmar com ele. Ele contou que tem 31 anos de carreira. Se eu completei 33, escuto-o desde os dois? Talvez. Isso porque o primeiro disco do Boca Livre era um dos que rolavam em casa. Provavelmente um pouco mais velha, eu ficava transformando em imagens concretas o coração vazio voando vadio feito uma pipa no ar. Eu as tenho em mente até hoje. E eu ficava ali, olhando para ele, naquela paixão de fã, voltando ao meu passado, voltando à música que sempre foi minha vida. Tinha Chico Buarque, Beatles, Deep Purple e Zé Kéti convivendo tão bem que pareciam de uma mesma turma. Esta era a minha turma. Uma turma que nascia do som pós agulha. A lembrança é tão forte que eu não me recordo de minha evolução motora empilhando brinquedos, lembro, sim, quando consegui colocar precisamente a agulha no disco, no início da música. Que sensação. Que progresso. Eu ganhava a importância da música que tinha na minha casa.
Com isso, ganhei outros aprendizados. Já contei em outro blog que minha mãe não fechava as portas para nada. Deixou entrar os já citados acima, deixou entrar Menudo, Titãs, Sting, U2, foi comigo comprar o segundo disco da Legião Urbana. E ela adorava cantar. Amante dos musicais do cinema, reproduzia tudo com afinação e beleza, talvez entendendo bem pouco do inglês de seus ídolos. E falava de música até na hora de me convencer a comer cebola: “cebola faz bem para a voz. Não ta vendo como eu canto?”. E caía na risada em seguida. E, sim, ela cantava o dia todo.
E é por isso que em shows como estes eu me encontro. Volto para casa. Sem nostalgia. Vejo a que vim. Entro nos acordes, saio de mim, e sempre volto. E tenho vontade de viver a vida. Assim, como música.

terça-feira, 24 de julho de 2007

Cenas da Vida

Estou no ponto de ônibus em frente a um grande colégio paulistano e uma mulher, aparentando 35 anos, bem vestida, provavelmente voltando do trabalho para casa, deixa cair uma moeda de 10 centavos no meio-fio. Não dá a mínima, olha e decide que não vale a pena se abaixar para pegar o dinheiro.
Passa alguns minutos, ela já tinha tomado seu ônibus, e pára uma outra mulher com um garoto de 7 ou 8 anos. Ambos com aparência mais simples do que a mulher que deixou a moeda cair. Ele vê a moeda e fica afoito para pegá-la e consegue. O dia dele mudou.


Estou na rua Diogo de Faria, esquina com Coronel Lisboa e há pessoas dos dois lados da Diogo, esperando o farol fechar para atravessar. Do lado de cá, vejo uma menina vestida com roupa de ballet, de mãos dadas com a mãe. Levo meu olhar para o outro lado da rua e vejo uma menina, não de rua, mas bem pobre, olhando atentamente para a menininha futura bailarina. O que será que a menina estava pensando? O quanto ela não queria estar ali, de mãos dadas com a mãe, voltando da aula de ballet?

Posso fotografar a cidade nas cenas das minhas viagens diárias por São Paulo. Eu estava em uma dessas ruas de casas grandes e luxuosas, quando me chamou a atenção uma família que vinha carregando uma carroça muito, mas muito cheia de material para reciclar. Tão cheia, que acabou batendo um dos "braços" na parte lateral de uma caminhonete, não lembro a marca, mas dessas grandes e lindas. Não deu outra: o dono do carro, falando no celular, desceu da caminhonete e começou a berrar com todos eles, que nem respondiam, porque, acho eu, nem podiam entender o tamanho da encrenca. Se um dia alguém me pedisse para imaginar uma foto da desigualdade social, essa seria perfeita.

segunda-feira, 23 de julho de 2007

Ano novo no zen

O silêncio era a melhor parte. Principalmente porque era o intervalo entre frases entoadas alternadas e entrelaçadas a sentimentos.
Meus sentimentos. Tantos juntos. Se houve dúvida em aceitar o convite de dois grandes amigos na noite anterior, em pouco tempo estar ali fazia todo o sentido.
As desconfianças e inseguranças ficaram para trás. Talvez retornem em um teste qualquer da vida.
Vida. Quanta celebração por ela. Em cada gesto, som, respiração. Nos olhares, nos sorrisos, nas reverências. Trocas. Experiências.
Se antes havia sido acariciada pelo barulho da chuva, tive a luz do dia, à minha frente, à espreita de um espaço, disputada com tantos corpos e almas.
Verdade. Estar ali por inteiro. Não há outra alternativa.
E as pétalas choveram. E aquilo que não sei o nome e que hipnotizantemente abria e fechava tocou-me por duas vezes. E passar pela Sensei é como olhá-la e sorrir: faz todo o sentido. E parece que o que te sustenta ali, parada, não são somente os pés.
Senti-me grata. Grata por ter vivido até ali. Grata por estar lá naquele momento e não em nenhum outro antes ou depois. Comecei a ver respostas. A razão – tal como costumamos concebê-la – não está. Não se trata disso.
Sinto-me como se tivesse novamente um abraço de mãe: religada. De volta. Estar de volta. É disto que se fala. Ter a vida de volta e a possibilidades. Todas as possibilidades. E como cheiram bem!
Olhei sem espantar.

domingo, 22 de julho de 2007

Viver numa metrópole é reclamar de sua dinâmica. Quase sempre. E como parar? Impossível. Impossível? É tempo de descobrir que em meio a barulhos de carros dá para parar e ouvir o canto dos pássaros. E não apenas sabiá – o que mais ouço e, não por isso, o meu preferido. Há outros. Bem-te-vis, maritacas. E mais tantos tons que eu nem sei identificar. Mas nem me importa. Parei para ouvi-los. E, junto, observei o céu o mudar de cor. Do azul ao rosa, ao amarelo, ao rosa novamente, mais forte, até tornar-se azul. Outro azul. Que escureceu com as estrelas e esquentou meu espaço. E os cachorros continuam latindo.

sábado, 21 de julho de 2007

Mania de explicação

Hesitei tanto em criar este blog. Apesar de saber que sou eu mesma que vou escrever, parece que, a partir de agora, minhas palavras sairão do controle. E sairão mesmo. E eu nunca as controlei, na verdade. E é por isso que as amo tanto.
Começo este novo momento, este acontecimento (ops, já foi!) ouvindo uma canção especial. É Just Like Heaven, com o The Cure. Especial por si só, especial por representar um dos momentos de rever a vida que venho tendo com mais lucidez desde que encontrei amigos como o Renato, que me reapresentou esta música e que me reapresenta a vida tantas vezes.
Vou falar dele, de mim, e de tantas outras pessoas que cruzaram meu caminho como este texto da Clarice Lispector que me inspirou o nome deste blog.
E, como ela dizia:
Até sempre!